Construção, Chico Buarque, 1971


Este parágrafo me fará perder muitos leitores, eu sei. A frase a seguir é que vai causar essa debandada: Chico Buarque pra mim tanto faz.

Obrigado a você que ainda está aqui. Não nego Chico Buarque, claro que não, mas não tenho aquela coisa que algumas pessoas tem da idolatria, de tratá-lo como o cara da MPB. A obra dele que mais me chamou a atenção na verdade foi o romance Benjamim. Outro problema são certos fãs que o chamam de Chico, numa intimidade forçada que me afasta dele e de certos artistas por medo de ficar igual a essas pessoas (por muito tempo evitei Clarice Lispector por causa dos supostos fãs que a chamam de Clarice). No Luau MTV dos Los Hermanos, o Rodrigo Amarante diz que a vontade que ele tem de conhecer algo é inversamente proporcional à quantidade de propaganda que é feita a respeito. Ele disse isso sobre os Strokes, mas confessou que se arrependeu quando finalmente ouviu a banda. E eu também tenho isso. Por isso nunca escutei O Teatro Mágico ou A Banda Mais Bonita da Cidade e, mais recentemente, evitei o quanto pude Marcelo Jeneci. Devo ter perdido muita coisa boa, mas, enfim, coisa minha.

Voltando à vaca fria, fora os clássicos conhecidíssimos “Deus lhe Pague”, “Cotidiano” e “Construção”, que são realmente muito interessantes, menos pela música que pela letra, destaco a versão de “Gesùbambino”, do italiano Lucio Dalla, que em português recebeu o título de “Minha História”. A letra conta a história de um menino Jesus de verdade, cuja mãe não sabia acalantos e o ninava cantando músicas de cabaré. Essa desconstrução dos mitos é importante – do mito Chico Buarque, inclusive. Na semana em que escutei esse disco, de 4 a 10 de agosto de 2011, fui a algum lugar com a Érica e a mãe dela, que comentou a respeito dos seguintes versos: “Esperando, parada, pregada na pedra do porto/Com seu único velho vestido, cada dia mais curto”. A metáfora da gravidez pelo encurtar do vestido é muito delicada e é esse tipo de construção que torna certas músicas mais significativas do que outras.

Mas a preferida é “Samba de Orly”, composta em parceria com Toquinho e Vinícius de Moraes. A introdução é um espetáculo, com os instrumentos entrando um por um e a cuíca truando. Sempre gostei de músicas que parecem cartas, principalmente agora que vou viajar pra longe e passar um bom tempo por lá. E embora eu dê mais atenção à letra da música do que à música propriamente dita, e ainda embora goste demais dessa letra, o samba roots que acompanha a letra é o que se destaca nessa canção. A seguir, um vídeo em que Chico Buarque e Toquinho interpretam essa música, cuja letra segue abaixo.


Samba De Orly
(Chico Buarque)

Vai, meu irmão
Pega esse avião
Você tem razão de correr assim
Desse frio, mas beija
O meu Rio de Janeiro
Antes que um aventureiro
Lance mão

Pede perdão
Pela duração dessa temporada
Mas não diga nada
Que me viu chorando
E pros da pesada
Diz que vou levando
Vê como é que anda
Aquela vida à toa
E se puder me manda
Uma notícia boa

Pede perdão
Pela omissão um tanto forçada
Mas não diga nada
Que me viu chorando
E pros da pesada
Diz que vou levando
Vê como é que anda
Aquela vida à toa
Se puder me manda
Uma notícia boa

FICHA

1. “Deus Lhe Pague” (Chico Buarque)
2. “Cotidiano” (Chico Buarque)
3. “Desalento” (C. Buarque, Vinícius de Moraes)
4. “Construção” e “Deus Lhe Pague” (reprise) (Chico Buarque)
5. “Cordão” (Chico Buarque)
6. “Olha Maria (Amparo)” (C. Buarque, V. de Moraes, Tom Jobim)
7. “Samba de Orly” (C. Buarque, Toquinho, V. de Moraes)
8. “Valsinha” (C. Buarque, V. de Moraes)
9. “Minha História” (Lucio Dalla; versão de C. Buarque)
10. “Acalanto” (Chico Buarque)

5 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Chico Buarque em sua música me fez ter curiosidade quanto a MPB, os sambas que primeiro respeitei foi os que ele cantava. Comprei esse disco em CD e outros de sua discografia nas promoções das Lojas Americanas por dez reais cada, além de outros artistas da nossa música brasileira, que nem é tão popular assim. Acredito que a arte desse cara me fez descobrir a minha nacionalidade musical.

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  3. O melhor é começar o post dizendo que tanto faz e depois rasgar vários elogios, hehe... Pode não idolatrar, mas não sei se tanto faz não...

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    1. Eu sou volúvel! Jamais negaria Chico Buarque, mas coloco o Caetano Veloso por exemplo, num patamar acima.

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  4. Você deve ser muito jovem mesmo pra implicar com coisas tão insignificantes,tipo chamar Chico de Chico.A vida é muito mais do que isso.Não sabia que você valorizava tanto letra de música,dei minha opinião sobre isso em outro post.Me pareceu contraditório gostar tanto de letra, e não ser fã de Francisco Buarque de Hollanda.

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